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7 de fevereiro de 2022
 

 


 

RIO — Dias após o assassinato de Durval Teófilo, repositor negro morto por um sargento da Marinha em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio, a família diz sofrer intimidações em uma tentativa de abafar o caso. O GLOBO apurou que as ameaças sofridas pela família são "veladas" e teriam partido de vizinhos e conhecidos do autor do crime. Ao menos dois comentários colocaram em dúvida a segurança da viúva e da sua filha. Num deles, foi dito para ambas terem cuidado pois agora estão sozinhas. Temendo por sua integridade, a família deixou o condomínio.

A viúva, Luizane Teófilo, explica que o advogado da família, que também é assistente de acusação no caso, acompanha as tentativas de intimidações. Ainda não foi feita uma queixa formal, mas as intimidações teriam como objetivo fazer que a família parasse de comentar o caso na mídia.

A viúva e a filha não estão morando no condomínio em que Durval foi assassinado, mas a família teme por sua segurança.

— Não adianta me coagir, eu não sou amiguinha da família dele (do sargento) nem sei quem são ou quero saber. Não estou aqui por fama ou para ganhar likes. Eu perdi meu melhor amigo — diz Luiziane.

Família participou nesta segunda-feira (7) de uma reunião com duas Comissões da Assembleia Legislativa do Rio. A deputada Dani Monteiro (PSOL), presidente da Comissão de Direitos Humanos, e Carlos Minc (PSB), presidente da Comissão de Combate ao Racismo, ouviram relatos de intimidação


Família participou nesta segunda-feira (7) de uma reunião com duas Comissões da Assembleia Legislativa do Rio. A deputada Dani Monteiro (PSOL), presidente da Comissão de Direitos Humanos, e Carlos Minc (PSB), presidente da Comissão de Combate ao Racismo, ouviram relatos de intimidação


A família participa, nesta segunda-feira, de uma reunião com duas Comissões da Assembleia Legislativa do Rio. Os deputados estaduais Dani Monteiro (PSOL), presidente da Comissão de Direitos Humanos, e Carlos Minc (PSB), presidente da Comissão de Combate ao Racismo, recebem os familiares e seus advogados. Os parlamentares prestam auxílio jurídico e dizem que irão cobrar um posicionamento oficial da Marinha sobre o caso:

— Até o momento, ninguém veio pedir perdão. O que eu mais quero é Justiça, não apenas paras os negros e por Durval, mas também pela minha filha. Todo o tempo ela pergunta se o papai vai voltar — desabafa Luizane, emocionada.

Racismo a caso Moïse


A família credita o crime principalmente ao racismo. Luizane lembra que, dias antes da morte, ela e Durval conversaram sobre uma outra morte brutal no Rio: do congolês Moïse, também negro, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio.

— Há uma semana estaca conversando com meu esposo desse rapaz que foi morto na orla da praia. E eu falei: "nossa, como o mundo está estranho". Quando eu era criança, no meu ponto de visto, não era tão agressivo. E eu tinha muito medo disso (racismo) chegar na minha porta. E infelizmente chegou. A gente vê na televisão e nunca acha que vai chegar na família, em um amigo próximo. Infelizmente essa violência chegou na porta da minha casa e só aconteceu porque meu marido era negro— ressaltou:

— Eu não aceitei, não vou aceitar e não irei ficar calada. Se aconteceu isso com meu marido, pode acontecer com o restante da família — disse.

Também muito emocionada, a irmão de Durval, Priscila Teófilo, diz que carrega no tom de pele o medo de viver com o racismo e se demostra revoltada com a primeira tipificação do crime. Na ocasião a Polícia Civil indiciou o sargento Aurélio Alves Bezerra por homicídio culposo, por entender que o militar achou que Durval fosse um assaltante. O Ministério Público conseguiu na Justiça mudar a tipificação do crime para doloso e novos depoimentos serão prestados sobre o caso.

— Nunca imaginei que ia acontecer comigo. Que teria que por a cara no jornal para falar que assassinaram meu irmão. Sofremos desde nascemos. Todos nós pretos sabemos como é doido você entrar em um lugar e ter alguém atrás de você. Mas o que ele fez foi covardia. Só espero que o Durval não seja mais um. Não aguento quando dizem que ele agiu em legítima defesa. Meu irmão não estava armado. Que legítima defesa é essa? — questiona Fabiana.

A prima de Durval, Priscila Teófilo é mãe de um jovem negro de 16 anos. Ela afirma revoltada estar cansada de "ensinar para ele o que um jovem de olhos verdes da Zona Sul do Rio não aprende".

— A gente nasce como uma cartilha de como ser preto e sobreviver nesse país. Não dá. Não pode. Tenho que corrigir meu filho de como ele vai se vestir, com quem andar, locais que vai frequentar. Ele estava participando do programa jovem aprendiz em um mercado e me disse: "Todo dia eu levo dura e jogo tudo da minha mochila no chão". Chega, gente. Não sei que ódio é esse pela gente. Dizem que temos que estudar, ter emprego pra andar de cabeça erguida. O Durval saiu da comunidade com a intenção de dar uma melhor condição de vida pra família dele e é morto na porta de casa a dois passos da família dele. Ele (o militar) pode ficar na cadeia por 30 anos e isso não vai trazer o Durval de volta. Mas o próximo que estiver na rua, pensado em fazer a mesma coisa vai pensar duas vezes. Durval não vai cair no esquecimento. Vamos sacudir o mundo inteiro para respeitarem a gente — diz com revolta.

'Quando o papai vai levantar da caminha?', perguntou a filha após o velório


Com apenas 6 anos, a filha do casal aos poucos começa a entender o que ocorreu com seu pai. Muito emocionada, Luizane conta que a filha era muito ligada ao pai.

— Todo santo dia ela vem me perguntar quando "meu pai vai levantar da caminha", que é o caixão. É horrível, gente. Eles eram muito ligados. Tenho uma criança sonhando com a volta do pai. Como será o aniversário dele, o dias dos pais? Ela estava querendo fazer uma festa de aniversário com o tema de unicórnio mas pediu para não ter mais por vergonha das outras crianças terem o pai e ela não — diz.

Fonte: O Globo

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Familiares de Durval se reuniram com os deputados Dani Monteiro (PSOL) e Carlos Minc (PSB) Foto: Felipe Grinberg / Agência O Globo

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